1.2. Os responsáveis pela crise na habitação
À Direita tenta-se proteger os especuladores e argumenta-se que a subida de preços se deve à falta de construção. Tudo se resumiria, dizem, a uma questão de oferta e de procura. Este argumento não passa de um ato de fé desmentido pela realidade. Tanto o parque habitacional como o número de famílias a residir em Portugal pouco se alteraram nas últimas décadas. Na verdade, nas grandes cidades, como o Porto e Lisboa, a população regrediu continuamente entre 2001 e 2021.
A escalada histórica dos preços da habitação foi potenciada, primeiro, pelo período de taxas de juro historicamente baixas que tornaram o imobiliário num ativo atrativo pela sua rentabilidade e, depois, pelo processo inflacionista, que aumentou os custos do endividamento. No entanto, se estas são causas transversais a vários países, há elementos que justificam a particular gravidade da situação em Portugal: a promoção do turismo de massas e do turismo habitacional de luxo, com o regime do Residente Não Habitual ou os Vistos Gold; a liberalização do mercado do arrendamento; a proliferação desenfreada do Alojamento Local; ou os incentivos fiscais aos fundos de investimento imobiliário, contribuíram ativamente para fazer subir os preços das casas.
Cada vez mais detentores de capital, sem qualquer intenção de algum dia virem viver para Portugal, compram e vendem as nossas casas. Usam-nas como ativos financeiros. O seu único propósito é inflacionar os preços e vender com lucro.
Depois de criada a tempestade perfeita, o PS recusou-se a aplicar qualquer medida estrutural capaz de alterar as condições do mercado imobiliário. Os benefícios fiscais ao arrendamento mostraram-se ineficazes e os apoios às rendas, embora necessários, se não forem acompanhados de medidas para baixar os preços, têm como consequência retroalimentar o processo de inflação imobiliária. É uma abordagem tão liberal quanto a dos liberais.
Como a realidade mostra, as razões liberais não explicam a escalada dos preços, pelo que as suas políticas também não resolverão o problema. São precisas medidas capazes de combater a especulação, baixar os preços, devolver a habitação às pessoas e aumentar o parque público habitacional. O controle de rendas é uma medida de proteção da habitação já aplicada ou em processo de aplicação em muitos outros países.
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As medidas para elevar o preço da habitação foram meticulosas e insistentes: Vistos Gold: entre outubro de 2012 e janeiro de 2023 foram concedidos 11628 vistos gold, que abrangem 18692 pessoas, com investimentos na quase totalidade em imobiliário, o que sobe os preços.
Alojamento Local: os cem mil alojamentos locais foi ultrapassado e, com a construção de hotéis (mais 67 em 2023), reduz o espaço para habitação e inflaciona os preços.
Benefícios fiscais a fundos de investimento imobiliário: incentiva a compra de habitação e a sua transformação em alojamento local ou outras formas de residência turística. Sobe os preços e são os contribuintes quem paga.
IRS mínimo para residentes não habituais: em 2022, já eram 74258 pessoas a beneficiar de IRS de 10% (reformados) ou de 20% (trabalhadores), com um custo fiscal acima dos 1500 milhões de euros. Esse número disparou em 2023 e, como o governo deu mais um ano de inscrição no sistema, em 2024 ainda crescerá mais: serão mais de cem mil pessoas que pagam muito menos do que os contribuintes portugueses com os mesmos rendimentos e que, assim, podem comprar casas caras com os benefícios que o Estado lhes oferece. Até ao fim do regime em 2034, se não for de novo estendido, a nova despesa fiscal ultrapassará os 20 mil milhões de euros – muito mais do que o total do PRR. E os preços das habitações sobem, com os contribuintes a pagarem um subsídio para que estes privilegiados comprem habitações caras.