2.5. Investir no SNS, combater o negócio da saúde
O PS tem afirmado que está a aumentar o orçamento do SNS. A verdade é que: 1) mais de 5 mil milhões do orçamento do SNS são desviados todos os anos para financiar o setor privado; 2) o investimento prometido nunca foi concretizado; 3) o SNS continua estrangulado pelos vetos de gaveta e em orçamentos que não chegam para as necessidades.
Enquanto 1 em cada 3 euros do orçamento do SNS vai para contratar serviços externos, o investimento, sempre em mínimos, continua por concretizar, deixando o SNS sem dinheiro nos últimos meses do ano. Face à suborçamentação, o Ministério das Finanças adia autorizações para investimentos, altera unilateralmente planos de atividades de hospitais e corta nos seus mapas de pessoal.
Durante a pandemia, o governo acordou pagar aos hospitais privados até 8.400€ por cada doente com Covid, aceitou a cartelização dos preços dos testes e contribuiu para engrossar os lucros dos grupos de laboratórios privados. Mais recentemente,enquanto encerrava maternidades e urgências a um ritmo semanal, o Governo decidiu pagar até 3 mil euros por parto realizado no privado. A maior parte dos exames realizados em ambulatório são convencionados (700 milhões de euros em 2022) e a diálise em Portugal está nas mãos de três grupos económicos a quem o SNS paga mais de 200 milhões por ano. Ao longo dos anos, o SNS encerrou camas para que o privado as abrisse e depois vendesse internamentos ao setor público.
O SNS podia e devia fazer mais diálise e mais exames; ter capacidade para realizar todos os partos e responder, sem dificuldades, às necessidades de saúde da população. Mas isso não garantiria o negócio. Por isso o Governo não quis investir em equipamentos e internalizar procedimentos.
As coisas não aconteceram por acaso. Foram deliberadas. E os resultados estão aí: só a Luz Saúde, a CUF e a Lusíadas Saúde tiveram, em 2022, rendimentos de mais de 1.300 milhões de euros. A CUF aumentou os seus lucros, no primeiro semestre de 2023, em mais de 60%. Ao mesmo tempo, o SNS continua à míngua, sem capacidade de investir, sem melhorar as remunerações dos seus trabalhadores, sem autonomia e agilidade para contratar e investir o que necessita, quando necessita.
O negócio da saúde é também o que está a dar cabo da nossa Saúde. Combater a facilitação de um negócio que desvia o orçamento do SNS é fundamental para termos mais e melhores cuidados de saúde para todas e para todos.
Medidas para financiar o SNS
Medidas para financiar o SNS
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Adequar o Orçamento do SNS às reais necessidades da população. Para isso, as instituições do SNS – hospitais, centros de saúde, INEM, etc. – devem comunicar as suas necessidades previstas orçamentais, de investimento e de pessoal, e o orçamento do SNS do ano subsequente deve corresponder às necessidades identificadas.
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Autonomia e responsabilização das administrações das unidades do SNS que permitam resposta adequada e em tempo útil às necessidades de cada momento.
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Criar um plano plurianual de investimentos associado a uma carta nacional de equipamentos de saúde, com dotação própria, que permita combater a obsolescência tecnológica pela renovação e aquisição de novos equipamentos.
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Excluir o SNS da aplicação da Lei dos Compromissos.
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Integração no SNS dos hospitais que o governo PSD/CDS entregou (e que o PS manteve) à gestão das Santas Casas da Misericórdia (Serpa, Anadia e Fafe).
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Revogar o decreto-lei que regula as parcerias de gestão na área da saúde e abre portas a novas parcerias público-privado no SNS, da legislação que permite a privatização dos cuidados de saúde primários através das USF-C e do decreto-lei que cria as novas ULS, que concentra recursos e afasta os serviços das populações.
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Gestão democrática das unidades de saúde.
Para regular o funcionamento do setor privado
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Regular a publicidade em saúde, criando novas regras que limitem o estímulo ao consumo de cuidados e produtos que não tenham vantagens demonstradas em saúde e reforçando os meios de fiscalização da mesma;
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Legislar e regular produtos como planos e cartões de saúde;
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Proibir as seguradoras e instituições privadas de interromperem internamentos ou tratamentos vitais iniciados em unidades de saúde privadas ou do setor social, por razão de insuficiência económica;
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Forçar as unidades de saúde privadas e seguradoras a ressarcir o SNS dos recursos gastos com doentes que sejam transferidos para unidades públicas a meio de um internamento ou tratamento vital, ou quando a transferência decorre de complicação de tratamento ou procedimento iniciado na unidade privada.
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Fazer depender o licenciamento de unidades privadas de autorização do Ministério da Saúde e tendo em conta a já existente oferta pública. Obrigar as unidades privadas à publicação anual de indicadores de resultados clínicos, nomeadamente: inventário anual de doentes tratados e respetivas patologias, procedimentos e tratamentos realizados, mortalidade, taxa de internamentos, taxa de complicações e infeções hospitalares.
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Auditoria dos preços praticados e padrões de prestação de cuidados de saúde pelas unidades de saúde privadas, nomeadamente sobre a utilização de meios complementares de diagnóstico e terapêuticas/tratamentos.
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Colocar o Laboratório Nacional do Medicamento a produzir medicamentos que registem faltas persistentes e rupturas.
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Articular a investigação feita nas universidades e nos laboratórios públicos com o Laboratório Nacional do Medicamento, no sentido de produzir e disponibilizar à população novos medicamentos e terapêuticas.
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Exigir à indústria farmacêutica transparência na formação de preços e proteger os medicamentos como bem público que deve ser acessível a todas as pessoas.
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Aumentar a utilização de genéricos e biossimilares e fazer com que as embalagens comercializadas coloquem em destaque a denominação comum internacional em vez da marca comercial.
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Promover a revisão e renegociação centralizada dos contratos de aquisição de materiais e dispositivos médicos de elevado volume de utilização a nível nacional procurando a redução de despesa das unidades de saúde.
As PPP foram prejudiciais aos utentes
Dizem os liberais, toda a direita e parte do PS que as Parcerias Público Privado da saúde foram uma gestão eficiente e que beneficiava as pessoas. Há portanto uma história neste favorecimento. O PSD e o PS favoreceram a entrega de hospitais públicos ao privado. Em 1995 Cavaco Silva deu o Amadora-Sintra ao grupo Mello, iniciando processos rocambolescos que levaram ao fim do contrato em 2009. O governo PS de 2001 propôs entregar dez hospitais, primeiro Loures, Cascais, Braga, Vila Franca e Sintra, depois Évora, Gaia, Póvoa do Varzim, Algarve e Guarda.
Luís Filipe Pereira, funcionário do grupo Mello, enquanto ministro da saúde do governo PSD/CDS, deu o hospital de Loures ao seu antigo grupo. O contrato foi depois anulado e o hospital foi entregue ao grupo chinês Fosun.
Quanto aos resultados destas operações, basta ler os relatórios oficiais. Afirma o Tribunal de Contas em 2009: “o programa de PPP ainda não deu origem a qualquer processo de contratação completo, pondo em causa a credibilidade do programa”. Em 2013, O Tribunal insistiu: “ainda não existem evidências que permitam confirmar que a opção pelo modelo PPP gera valor acrescentado face ao modelo de contratação tradicional”.
Escreveu a Entidade Reguladora da Saúde em 2016 : “não foi possível identificar diferenças estatisticamente significativas entre os resultados dos hospitais PPP e os outros hospitais do SNS” e “os hospitais PPP apresentaram quase sempre menor percentagem de primeiras consultas médicas realizadas dentro do tempo máximo de resposta garantida”.
Aqui está a resposta: as PPP foram pagamentos a empresas privadas que geriram mal e prejudicaram as populações.