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3.4. Combater a pobreza

Depois de uma diminuição em 2021, a taxa de risco de pobreza (que inclui as pessoas que vivem com rendimentos mensais líquidos inferiores a 591 euros) voltou a subir, para os 17%, em 2022, segundo os dados do Instituto Nacional de Estatística (INE). Este aumento de 0,6 pontos percentuais corresponde a um acréscimo de 80 mil pessoas na pobreza.

GRÁFICO 23 – Taxa de risco de pobreza 2003 – 2022
Fonte: INE, Inquérito às Condições de Vida e Rendimentos, 2023

Os resultados do Inquérito às Condições de Vida e Rendimentos divulgados no final de 2023 revelam que o risco de pobreza infantil se acentuou em 2,2%. Destaca-se ainda o facto de a pobreza atingir mais as mulheres do que os homens e de, a par das crianças, os desempregados serem um grupo particularmente afetado, com 46,4% dos desempregados numa situação de pobreza (mais 3% que em 2021).

GRÁFICO 24 – Taxa de risco de pobreza, população empregada e população desempregada
Fonte: INE, Inquérito às Condições de Vida e Rendimentos, 2023

Apesar de as transferências sociais terem um grande impacto na mitigação e redução da pobreza (sem transferências sociais, a taxa de risco de pobreza seria mais do dobro), têm vindo a perder eficácia.

A existência de formas precárias de emprego que não permitem aceder às prestações de desemprego, designadamente por inexistência do prazo de garantia exigido, o enorme volume de trabalho informal (sem proteção social), a debilidade da proteção dos trabalhadores independentes e o facto de os subsídios de desemprego terem sofrido, desde 2010, alterações na sua cobertura e valor e o reduzido valor das prestações de combate à pobreza explicam a insuficiência dos apoios sociais.

TABELA 6 – Desigualdades no rendimento em Portugal, 2017-2022
Fonte: INE, Inquérito às Condições de Vida e Rendimentos, 2023

Uma parte significativa dos trabalhadores desempregados não tem proteção, a cobertura do subsídio social de desemprego é muito escassa (cerca de 2% do número total de desempregados), continuamos a ter prestações de desemprego abaixo do limiar de pobreza. Não admira, por isso, que os desempregados sejam o grupo mais exposto à pobreza. Entre 2005 e 2018, a taxa de risco de pobreza dos desempregados já tivera um aumento de cinquenta por cento (de 28% para 42%). Ou seja, o problema vem de trás. Há cerca de uma década, o Governo PS (em 2010) fez alterações estruturais com enorme impacto no subsídio de desemprego: o cálculo do valor mínimo e máximo deixou de ter como referência o salário mínimo nacional, além de se terem alterado os períodos de concessão. A direita, a partir de 2012, acentuou este caminho. O PS, nos últimos anos, manteve-o no essencial.

Permanece na lei o triplo recuo ocorrido no tempo da troika: corte no valor da prestação, na duração do período de concessão e na condição de recursos do subsídio social. Nenhuma destas medidas foi ainda revertida. O único corte que foi eliminado na legislatura de 2015-2019 foi o de 10% no valor da prestação ao fim de 180 dias, além de se ter posto fim, por proposta do Bloco, às humilhantes e inúteis “apresentações quinzenais”. Na legislatura 2019-2021, houve uma majoração do valor mínimo do subsídio de desemprego. No período da maioria absoluta, nenhuma melhoria e a manutenção dos cortes vindos de trás nas regras do subsídio de desemprego.

O Rendimento Social de Inserção também tem perdido fulgor. Desempregados e os jovens adultos não têm tido no RSI uma medida capaz de lhes responder. Além disso, os valores do RSI ficam muito aquém do limiar da pobreza: em novembro de 2023, a prestação média de RSI era de 134,51 euros por beneficiário, por mês. Desde 2010, as alterações restritivas nas condições de acesso e na definição dos agregados familiares ditaram uma degradação da prestação. Os elementos diferenciadores da medida, assentes num compromisso do Estado com um plano de inclusão para cada pessoa, desvaneceram. A tudo, acresce o estigma social lançado sobre a medida.

Também os trabalhadores independentes são praticamente excluídos da proteção social quando ficam sem atividade. A dimensão do problema ficou clara quando mais de 200 mil trabalhadores requereram o apoio extraordinário para trabalhadores independentes durante a pandemia.

A transformação do sistema de proteção social não se resolve apenas com medidas temporárias. Exige alterações de fundo na regulação e proteção do trabalho, no desenho das prestações de desemprego e alterações profundas no RSI. É preciso alterar as prestações de desemprego, reverter os cortes no valor e na duração e criar novos patamares de proteção social que cubram todos os casos que não estão abrangidos pelas prestações de desemprego e pelo RSI, o que implica uma prestação social nova, de largo espectro, permanente, e com um fôlego diferente das que existem.

As propostas do Bloco:

  • Reforço do Rendimento Social de Inserção, aumentando o valor de referência do RSI e diminuindo a diferença da capitação entre os membros do agregado. O valor de referência deve ser equiparado progressivamente ao IAS e deve ser reforçada a componente de integração através do acompanhamento e da ação social e integrando-o, a prazo, num Rendimento Social de Cidadania;

  • Reforço das prestações de desemprego, designadamente: i) retomando o salário mínimo nacional como referência do valor mínimo do subsídio de desemprego contributivo (e não o IAS, que ainda por cima é inferior ao limiar de pobreza); ii) aumentando os períodos de concessão, voltando às regras de 2009; iii) tornando o valor do IAS o valor mínimo de referência do subsídio social de desemprego (atualmente é 80% do IAS no caso do trabalhador considerado isoladamente); mudar a condição de recursos do subsídio social de desemprego, tomando o IAS por elemento do agregado o valor de referência para acesso e mudando a capitação;

  • Criação de uma nova prestação social que unifique os apoios não contributivos. Numa primeira fase, este “Rendimento Social de Cidadania” deve ser capaz de cobrir os casos que não estão abrangidos pelas prestações de desemprego e pelo RSI (nomeadamente trabalhadores independentes, informais, trabalhadores com prazos de garantia inferiores a meio ano). Numa segunda fase, o Rendimento Social de Cidadania absorveria o RSI e o Subsídio Social de Desemprego (duas prestações não contributivas, isto é, financiadas pelo Orçamento do Estado), fundindo estes apoios numa nova prestação, sem o estigma atual e com um novo impulso. Ela funcionaria como uma prestação diferencial capaz de garantir que ninguém fica abaixo do limiar de pobreza;

  • Subordinação das novas políticas públicas à prévia avaliação no Parlamento do seu previsível impacto, positivo ou negativo, sobre a pobreza e a exclusão social. É instrumentalmente crucial que, para além de atacarmos as consequências sejamos capazes de prevenir as causas e que, para isso, as políticas setoriais – particularmente aquelas que objetivamente terão um potencial impacto sobre a pobreza – sejam aprovadas após uma prévia avaliação dos seus impactos na produção, manutenção ou agravamento da pobreza e da exclusão social;

  • Reforço da Estratégia Nacional de Integração das Pessoas Sem-abrigo. Entre outras medidas, deve haver um investimento substancial num programa nacional de “Housing First” (ou Casas Primeiro), através do qual, em articulação com os municípios, se concedam habitações sem impor condições prévias, como primeiro passo para o processo de reintegração. Em quatro anos, este programa deve dar resposta ao conjunto de situações identificadas. Deve também ser garantida a contratação de profissionais com formação especializada que acompanhem as pessoas, assegurando que o programa das “Casas Primeiro” tem capacidade de sucesso nos seus objetivos;

  • Universalização do abono de família, repondo-o o 4º, o 5º e o 6º escalões.

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