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6.2. Tributação justa dos lucros das grandes empresas e das atividades especulativas

Como já foi identificado, consolidou-se, ao longo das últimas décadas, um desequilíbrio estrutural nos sistemas de tributação, em benefício dos lucros e das grandes fortunas e em prejuízo do trabalho e dos consumos básicos. Para além de agravar as desigualdades económicas, este enviesamento priva o Estado de recursos essenciais para financiar serviços públicos abrangentes e de qualidade.

Apesar da retórica que sustenta sucessivas reduções da tributação sobre os lucros e que justifica os mecanismos de planeamento fiscal agressivo, não existe evidência empírica de uma relação inversa entre a tributação dos lucros, por um lado, e o investimento e o crescimento económico, por outro. A relação invocada pelos liberais é contrariada pela história económica – as décadas de maior crescimento e produtividade no período pós Segunda Guerra Mundial foram marcadas por controle de capitais e tributações muito superiores às de hoje – mas também pela evidência atual.

GRÁFICO 36 – Relação entre imposto sobre os lucros e crescimento económico
Fonte: Economic Policy Institute (Corporate tax rates and economic growth since 1947)

Justifica-se assim que, sem prejuízo das medidas de carácter internacional para combater a erosão das bases fiscais e a transferência de lucros, se corrijam aspetos do sistema fiscal português que promovem o planeamento fiscal agressivo e agravam a injustiça fiscal.

Os impostos que a EDP recusa pagar

Em 2019 a EDP anunciou a venda à Engie de seis barragens por um valor de 2200 M€. Perante o negócio, o Parlamento aprovou uma norma no Orçamento do Estado para 2021 que garantia que a verba do respectivo imposto de Selo sobre o valor do trespasse da concessão (110M€) fosse entregue aos municípios afetados pelas barragens. A disposição legal ficou sem efeito, não só porque o negócio foi antecipado para antes da entrada em vigor da lei do Orçamento, mas também porque a EDP nunca liquidou o imposto de selo.

Para evitar o pagamento, entre outras manobras de planeamento fiscal, a EDP montou uma falsa reestruturação: cindiu as barragens para uma nova empresa dentro do grupo EDP e depois vendeu as participações sociais dessa nova empresa a uma outra, a ser fundida na Engie. A empresa alegará que esta é uma reestruturação fiscalmente neutra, embora seja claro que o objetivo da operação foi apenas a obtenção de vantagem fiscal.

Embora tivesse em sua posse todos os elementos do negócio, e tendo mesmo sido alertado para o risco de planeamento fiscal agressivo, o Governo autorizou a venda das concessões sem colocar como condição o cumprimento das respetivas obrigações fiscais. Para além do imposto de selo, que será agora disputado pela Autoridade Tributária, persistem dúvidas relativamente ao IRC efetivamente suportado pela EDP sobre as mais-valias da venda. Finalmente, a operação foi ainda isenta de IMT, uma vez que a EDP disputou em tribunal arbitral a anterior decisão da Autoridade Tributária de cobrar IMI e, logo, IMT, sobre as construções afetas às barragens.

Em fevereiro de 2023, o Governo do PS alterou finalmente a sua posição, emitindo um despacho que obrigava a AT a cobrar o IMI a todas as barragens. Apesar disso, o ano acabou sem que a EDP ou ENGIE pagassem o respetivo imposto aos municípios onde estão localizados os aproveitamentos hidrelétricos.

As propostas do Bloco:

  • Criação de um novo escalão da derrama estadual para empresas com lucros entre 20 milhões e 35 milhões com a taxa de 7%. Este novo escalão permite um pequeno aumento do IRC das empresas com maiores lucros, que pode ser canalizado para o financiamento dos serviços públicos e da segurança social;

  • Criação de um imposto sobre a prestação de determinados serviços digitais onde a participação dos utilizadores e das utilizadoras cria valor para as empresas prestadoras do serviço. O imposto aplica-se a: publicidade dirigida a utilizadores e utilizadoras de determinada interface ou plataforma digital (serviço de publicidade online); a disponibilização de interfaces ou plataformas digitais que permitam a quem utiliza localizar outras pessoas e interagir com elas, facilitando entrega de bens ou prestação de serviços subjacentes diretamente a esses utilizadores (serviço de intermediação online); a transmissão, incluindo a venda ou cessação, dos dados recolhidos gerados por atividades realizadas nas interfaces ou plataformas digitais (serviços de transmissão de dados). A taxa de imposto proposta é de 3% e as condições que obrigam ao pagamento do imposto são: que o volume de negócios no ano anterior tenha superado os 750 milhões de euros; que o montante total das suas receitas provenientes de serviços digitais sujeitas ao imposto, uma vez aplicadas as regras para a definição da base tributável e território nacional, supere 1,5 milhões de euros. Calcula-se que a receita assim obtida seja de 60 milhões de euros;

  • Revisão das regras de tributação aplicáveis aos grupos económicos e, em particular, às transferências de rendimentos intragrupo com vista à erosão da base tributável;

  • Reposição dos limites temporais para a dedução de prejuízos fiscais para 5 e 12 anos, conforme se trate de grandes empresas ou PME, respetivamente;

  • Criação de um imposto sobre lucros excessivos, aplicável aos setores em que estes se verificaram por força da inflação e elevadas taxas de juro, como a banca, a distribuição e a energia;

  • Tributação de todas as mais-valias em criptoativos em sede de IRS, eliminando a atual situação de privilégio face até a outros ativos financeiros.

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