9.2. Tolerância zero aos offshores
Investigações como os Panama Papers ou os Pandora Leaks mostraram como os offshores estão no centro do crime financeiro. Com base em milhões de documentos associados a 14 empresas especializadas em offshores, a investigação revela como líderes mundiais, celebridades e criminosos utilizam estes serviços para ocultar a origem das as suas fortunas, para fugirem aos impostos, para evitarem perguntas incómodas ou até mesmo escaparem à justiça.
Metade do mercado offshore é detido por apenas quatro países europeus – Holanda, Suíça, Luxemburgo e Reino Unido – a que se juntam a Irlanda, os EUA (Delaware e Nevada), Hong Kong ou Singapura, e também o Panamá e as conhecidas ilhas Caimão, Jersey, Virgens Britânicas ou Bahamas. Cada um destes países ou regiões cumpre uma função específica, especializando-se em diferentes serviços oferecidos pela rede offshore, que funciona por centros geográficos. Se a Suíça, por exemplo, é exímia na proteção do segredo bancário, o Luxemburgo facilita a criação de veículos financeiros, e a Holanda oferece vantagens fiscais às empresas europeias. Hong Kong serve o capital chinês, e as Bahamas ou o Belize são tipicamente utilizados por criminosos internacionais.
Nenhuma razão é boa para justificar a existência destas jurisdições, que promovem uma corrida para o fundo em impostos e impedem padrões mínimos de decência financeira. Ao invés de promover o investimento ou o emprego, como às vezes é sugerido, os offshores criam uma economia de opacidade e desigualdade. Às grandes empresas e detentores de fortunas individuais é assim concedido o privilégio de escaparem às normas e leis que, por questões de justiça ou de segurança, se aplicam a todas as restantes pessoas. O resultado é a facilitação de atividades ilegais ou abusivas, a descredibilização dos sistemas de justiça, o agravamento das desigualdades e a perda de importantes recursos financeiros que financiam os serviços públicos e o desenvolvimento económico.
Portugal: o preço dos offshores
Segundo o Observatório Fiscal da União Europeia, existem mais de 50 mil milhões de euros colocados em offshores por parte de pessoas e empresas portuguesas, a maior parte deles na Suíça, mas também nos Países Baixos, Luxemburgo, Irlanda, Bélgica, Macau, Hong Kong, Singapura, Porto Rico, Panamá, nas Ilhas Virgens Britânicas, Caimão e Bermudas.
Esta fuga de capitais representa mais de 22% do PIB português e uma perda de mais de 500 milhões de euros em receita de IRC, ou seja, 8,45% da receita total deste imposto.

A ONU recomenda a criação de uma taxa tributária mínima global e a realização de uma Convenção da ONU sobre Tributação, estabelecendo uma alternativa às regras tributárias da OCDE – que têm promovido o crescimento do sistema financeiro sombra.
Ainda que nenhum país possa declarar de forma unilateral o fim de todos os offshores, Portugal pode adotar um quadro legal de tolerância mínima ao recurso a estas jurisdições.
As propostas do Bloco:
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Revisão da lista de offshores para incluir todas as jurisdições com fiscalidade agressiva e para servir de referência a políticas de combate à corrupção, ao crime económico e ao abuso fiscal;
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Criminalização do recurso a serviços prestados por entidades situadas em territórios offshore;
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Exclusão do acesso aos apoios públicos e contratação com o Estado a empresas que sejam direta ou indiretamente participadas, detenham participações diretas ou indiretas ou sejam beneficiárias últimas de entidades offshore;
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Obrigatoriedade de publicação do organograma completo e detalhado das entidades coletivas que se enquadrem no âmbito de ação da Unidade dos Grandes Contribuintes. Este organograma deve incluir a estrutura acionista, bem como todas as participações detidas, indicando todas relações diretas ou indiretas com entidades offshore;
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Defesa da criação de um registo internacional dos beneficiários efetivos das sociedades offshore.