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12.2. Democratizar as Instituições de Ensino Superior, combater a mercantilização e reverter a precariedade

O Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior (RJIES) introduziu uma lógica mercantil no funcionamento do sistema, patente na entrada para os Conselhos Gerais dos representantes dos principais grupos económicos, ao mesmo tempo que remeteu a democracia na gestão da academia para um nível quase simbólico. O RJIES estabeleceu ainda uma hierarquia inaceitável entre universidades do mesmo sistema, introduzindo incentivos financeiros em função das escolhas de modelo de gestão e condicionando, por essa via, a autonomia das instituições.

A empresarialização da gestão académica, combinada com o défice democrático, transformou o Ensino Superior numa fábrica de gente precária: falsos bolseiros e bolseiras, docentes com contratos semestrais a assegurar tarefas permanentes, uso e abuso da figura de “docente convidado” para evitar a abertura de concursos para lugar de carreira são apenas alguns exemplos do estado de degradação que o setor atingiu.

O relatório da Comissão Independente de Avaliação do RJIES, apresentado recentemente, dá algumas pistas para futuras alterações. Porém, não existiu até hoje vontade do Partido Socialista na busca de modelos alternativos de governação das IES.

O Bloco de Esquerda elege como prioridade para a próxima legislatura uma profunda revisão do RJIES, envolvendo a comunidade académica e as demais entidades dentro do setor, assim como a abertura de um novo PREVPAP para o Ensino Superior e Ciência.

O Concurso Estímulo ao Emprego Científico, que decorreu desde 2017, falhou os seus principais objetivos, não tendo reforçado o emprego científico, nem potenciado o impacto da investigação científica no ensino superior. Pelo contrário, alargou o fosso entre a Ciência e o Ensino Superior, permitiu que a empresarialização da gestão académica fosse instrumentalizada para facilitar a precariedade e agudizou o défice democrático nas instituições de Ensino Superior.

A área da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior é aquela onde o emprego precário tem mais expressão. Segundo dados da Direção Geral da Administração e do Emprego Público, em junho de 2023, dos 93.442 contratos a termo existentes na Administração Central, mais de 18 mil estavam na área da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, representando 39% do total de contratos desta área.

GRÁFICO 49 – Percentagem de contratos precários por área governativa
Fonte: Síntese estatística do emprego público da direcão geral da administracão e do emprego público [in Jornal Expresso]

Assumir o combate à precariedade no Ensino Superior e na Ciência

O Processo de Regularização Extraordinária de Vínculos Laborais Precários na Administração Pública (PREVPAP) foi uma oportunidade perdida no setor da ciência. Ele expôs claramente a dimensão deste problema – na área da Ciência foram recebidos 3200 pedidos para regularização de docentes e investigadores, dos quais apenas 10% tiveram parecer positivo. Ao mesmo tempo, o número de contratados sem termo no final do processo que decorreu ao abrigo da norma transitória do Decreto-Lei n.o 57/2016 tem sido igualmente reduzido.

A oposição de muitos reitores e a inação do governo foram fatores críticos para o falhanço destes programas, sobrepondo-se com frequência à aplicação da lei e contribuindo para a manutenção sistemática de falsos bolseiros e bolseiras, docentes contratados e contratadas de semestre em semestre para assegurar tarefas permanentes, e uso abusivo da figura de “docente convidado ou convidada” para evitar a abertura de concursos para lugares de carreira. A estes problemas soma-se ainda uma tendência crescente de privatização do enquadramento contratual do trabalho docente e de investigação. Aqui, a naturalização da precariedade é feita através de vínculos intermi- tentes ou tornando as unidades de U&I (investigação e desenvolvimento) completamente dependentes da lógica de “projetificação” da ciência, na qual o investigador é levado a ocupar parte relevante do seu tempo a preparar constantemente candidaturas a projetos como forma de garantir o seu salário ou das equipas, gerando insegurança laboral e, frequentemente, desperdício de tempo necessário à produção científica.

Nos últimos oito anos ficou claro que apenas apenas o caminho inverso ao do subfinanciamento crónico do setor contribui para impor os contratos de trabalho como vínculo normal para o trabalho científico. É, portanto, nestas medidas que devemos apostar. A obrigatoriedade de cumprir uma percentagem crescente de investigadores nos quadros para acesso a financiamento, parece ser o caminho. No entanto, sem um aumento progressivo e sustentado do financiamento plurianual contratualizado com as instituições de ensino superior e ciência, o combate à precariedade será sempre uma batalha perdida, como parece estar a mostrar o programa FCT-Tenure.

É também imperativo promover uma revisão articulada dos estatutos de carreira de investigação e docência, de modo a permitir uma maior compatibilização entre ambos, revendo também os mecanismos de progressão de forma justa, transparente e abrangente, e pondo fim ao recurso a legislação avulsa para benefício apenas de alguns.

O funcionamento da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT) é pautado por uma burocratização estrutural que, aliada à falta de meios e pessoal técnico, deixa o setor numa imprevisibilidade e atrasos constantes. O aumento do orçamento para a ciência, proposto neste Programa, deverá ser executado com rigor e acompanhado de uma avaliação consequente dos programas de investimento anteriores. Também o funcionamento da FCT carece de reavaliação, de forma a garantir mais autonomia e financiamento plurianual.

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