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19.2. Violências de género

As violências de género, tantas vezes silenciadas, registam ano após ano estatísticas que envergonham o país. De acordo com o Relatório Anual de Segurança Interna (RASI) mais recente, em 2022 houve 29 mil 258 participações por crime de violência doméstica contra mulheres, o que representa um aumento de participações de 9,7% face ao ano anterior. A violência doméstica contra cônjuge ou situação análoga continuou a ser o crime mais participado em Portugal (26 073 queixas). Sendo que do total de vítimas de violência doméstica, a maioria são mulheres e raparigas (72,4%), enquanto que a maioria dos denunciados são homens (80,2%). A marca de género destes crimes é inquestionável.

As violências de género sobressaem também nos crimes contra a liberdade e a autodeterminação sexual. Nos casos de abuso sexual de menores, 93,5% dos arguidos são homens e as suas vítimas correspondem a 82% de raparigas e 18% de rapazes. Nos crimes de violação, cujas denúncias cresceram 30,7% entre 2021 e 2022, 97,7% dos arguidos são homens e 93,6% das vítimas são mulheres.

A denúncia do crime de violação não pode continuar a ser responsabilidade única da vítima, o que exige a alteração da natureza do crime para crime público. Igualmente, a expressão do consentimento livre, conforme definida no artigo 36.o da Convenção de Istambul, tem de ser claramente inscrita na tipificação do crime de violação, pois é na ausência de consentimento que radica a violência do ato e a natureza do crime.

Acresce que as mulheres mais pobres, as mulheres lésbicas, bissexuais e trans, as pessoas não-binárias, as pessoas racializadas e as pessoas com deficiência são alvo de múltiplas violências. Exemplo disso, as mulheres e raparigas com deficiência têm 2 a 5 vezes mais probabilidade de sofrer violência e 34% das mulheres com problemas de saúde ou com deficiência já foram agredidas física ou sexualmente por um companheiro, de acordo com dados revelados pelo Fórum Europeu da Deficiência.

Em Portugal, desde que foi criado o Observatório de Mulheres Assassinadas (UMAR) há registo de 647 mortes nas duas últimas décadas (2004- 2023). Só entre 1 de janeiro e 15 de novembro de 2023, houve 25 mulheres assassinadas, tendo sido 15 vítimas de feminicídio em contexto de relações de intimidade e 10 noutros contextos. Em 12 dos casos de feminicídio tinha sido identificada violência prévia e em 6 deles já tinha sido feita denúncia às autoridades.

As mulheres vítimas de violência doméstica sofrem com especial gravidade os problemas de habitação, em especial, porque grande parte das vezes são elas que são forçadas a abandonar a casa de morada de família. As medidas de coação de afastamento da vítima têm de prever que quem abandona a casa de morada de família é o agressor e não a vítima.

Propostas:

  • Alteração da natureza do crime de violação para crime público;

  • Alargamento da bolsa pública de fogos para vítimas de violência doméstica;

  • Criação de uma bolsa pública, de renda acessível, para famílias monoparentais;

  • Garantia que as mulheres vítimas de violência doméstica e os seus filhos têm prioridade na atribuição de habitação pública e a custos controlados, no caso de terem de abandonar a moradia familiar;

  • Inscrição do princípio do consentimento, manifestado de forma clara e por vontade livre da pessoa, nos termos do artigo 36.o da Convenção de Istambul;

  • Tipificação do crime de assédio sexual, em conformidade com a Convenção de Istambul, e reforço do combate à violência sexual online;

  • Reforço e expansão das Secções Especializadas Integradas de Violência Doméstica (SEIVD);

  • Formação especializada dos/as funcionários/as públicos/as da área social e judicial em matéria de violência de género;

  • Reforço do apoio às vítimas no decurso dos processos judiciais, nomeadamente através de ordens de interdição, de emergência, de restrição ou de proteção, de modo a afastar os agressores e não as vítimas;

  • Reforço do apoio às vítimas de violência doméstica, nomeadamente através do aprofundamento de direitos no trabalho, acesso à habitação, educação e segurança social;

  • Assegurar fontes de financiamento estáveis para a Rede Nacional de Apoio a Vítimas de Violência Doméstica e para as demais respostas de combate à violência de género;

  • Reconhecimento de que as crianças que são testemunhas de violência são profundamente afetadas por ela, o que impõe a avaliação da atribuição do estatuto de vítima e a obrigatoriedade de articulação entre a jurisdição criminal e a jurisdição de família e menores, incluindo a criação de tribunais com competência mista para esse efeito.

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